08/06/12

Retrato de Mulher

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Tem de ser à escolha.
Tem que mudar para que nada mude.
É fácil, impossível, difícil, vale a pena tentar.
Olhos tem, se necessário, azuis agora, cinzentos logo,
pretos, alegres, cheios de água sem explicação.
Dorme com ele por ser a mais à mão, única no mundo.
Tem quatro filhos dele, filho nenhum, um.
Ingénua, mas quem dá melhores conselhos.
Frágil, mas a de maiores carregos.
Lê Jaspers e revistas femininas.
Não tem cabeça fria, pois há-de tê-la...
Não sabe para que serve um parafuso, e faz a ponte.
Nova, como sempre nova, ainda e sempre nova.
Segura nas mãos um pardalito com uma asa partida,
o seu próprio dinheiro para a viagem longa e longínqua,
o cutelo para a carne, compressas e um copo da mais forte.
Para onde corre assim? não lhe dá o cansaço?
Claro que não, só um pouquinho, muito, não faz mal.
Ela ou o ama, ou faz por o amar.
A bem, a mal e pelo amor divino.


(W. Szymborska, Paisagem com Grão de Areia)